domingo, 28 de dezembro de 2008

Terra

No parque, em busca de alguma coisa, coisa esta que não sabia o que era. Talvez estivesse ali à espera do acaso e de tudo aquilo que pode vir decorrente dele. É domingo, céu levemente pincelado por formas horizontais cinzas, árvores tipicamente urbanas balançam ao som do vento. Do cimento úmido, um misto de terra e concreto, natural e artificial, erguem-se incontáveis formas rígidas desbotadas, que parecem tanto nativas quanto a antiga mata local. Então cruzo as duas vias que desafogam no parque natural como quero, pois é domingo, é fim de ano, e carros e pessoas estão sonolentos em seus apartamentos, e as pistas estão livres para raros andarilhos como eu. Chego ao parque e avisto uma razoável quantidade de pessoas. Algumas crianças penduram-se nos brinquedos do pequeno parquinho da entrada, casais andam de mãos dadas ou beijam-se nos assentos mais escondidos na mata, e alguns apenas procuram uma boa foto. Ando, observo, maravilho-me com tudo aquilo que sabemos que existe de lindo na natureza. Repentinamente, porém, assalta-me uma sensação de inexatidão, ou melhor, de incompletude. É como se eu não conseguisse dar conta da beleza natural, como se meus sentidos fossem sobretudo pobres e insensíveis para me integrar à natureza. Então ando mais um pouco, subo um lance de escadas de pedra e alcanço um nível um pouco acima do pequeno rio que divide o parque. Acima, há um museu e um centro de arte e cultura. Na entrada das construções, uma exposição de fotografia está afixada solenemente sob uma pequena tenda azul. Não há ninguém por perto, então debruço-me na leitura das fotos. Detalhes da natureza e do cotidiano do parque estão recortados ali, naquelas imagens. Ainda assim, algo parece-me obscuro, nebuloso e saio da pequena exposição com a mesma sensação das caminhadas. O céu está mais sombrio do que antes, e um vento forte sopra do leste. É a chuva. A cada passo, a chuva ganha força, e os visitantes saem em disparada em busca de refúgio ou da saída. Eu ando tranquilo, porque, de alguma maneira, a chuva parecia retirar de mim aquilo que havia de incompleto. Mesmo sabendo da temporalidade de tudo aquilo, sigo andando, e a chuva segue me molhando. Volto pelo mesmo caminho pelo qual caminhei quando da minha entrada no bosque. Já não há quase ninguém por ali, salvo alguns escondidos sob o toldo de uma lanchonete. Deixo o parque e me sinto como que parte de toda aquela euforia natural iniciada pela chuva. Agora, sinto que, enfim, pertenço a este incomparável lugar chamado Terra.

2 comentários:

... disse...

boa narrativa, o trecho final ficou ótimo!!(já passei por experiência semelhante, mas no meu caso foi chuva e ódio hehe)

Luara Quaresma disse...

Quem sabe a gnte se encontra pelo caminho.